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domingo, 26 de setembro de 2010

QUAL É O SEU BRINQUEDINHO PREDILETO? por Marli Gonçalves

Pegue um pedaço de bolo, um copo de guaraná, e sente-se no chão. Vamos brincar. É tempo das crianças, de Cosme e Damião, dos Erês. De a gente não esquecer que há uma criança (ou mais) dentro de todos nós. E não é gravidez. Sempre quis ter dinheiro para poder comprar sonhos, com recheio, fantasias e prazeres


Brinquedinhos: quando a gente cresce, usamos esta palavra mais para falar dos acessórios de prazer, tipo vibradores. Como se tudo aquilo que nos divertia tivesse ficado para trás e adultos não pudessem rir, se divertir, comer doces, se lambuzar com outras coisas senão sexo. Até parece. Quando a gente cresce é que, além do sexo, pode brincar com as coisas de que gosta da forma mais intensa. Sempre quis ter dinheiro o suficient e para comprar brinquedinhos, que de acordo com os gostos podem custar muito caro. Sempre admirei meus amigos que podem e gostam de gastar com parafernálias, coleções, bric-a-bracs, mostrando a si próprios para o que serve a felicidade de seus ganhos, ao invés da sovinice dos amargurados. Coleções de pianos, de carros, outras nem tão dispendiosas. Alguns colecionaram mulheres, maridos e filhos. Outros, obras de arte. Há os que têm várias casas, carros, motos. Quem tem barco, avião, helicóptero. Ayrton Senna tinha uma casinha só para seus "jet-skis", e uma pista de "autorama" de verdade, para os karts.

Contudo, há uma diferença bem grande entre considerar essas vontades brinquedinho ou apenas comprá-los para demonstrar riqueza, para esfregar na cara dos outros, coisas de meninos bobos; bobos, desde quando eram crianças, certamente. Conheço muitos desses também. Um desperdício.

Mais humilde, já sofro muito até quando entro em alguns lugares como livrarias e papelarias. Fico ali babando por "brinquedos" que não posso ter. Me seguro muito para não comprar bobagens que até poderia comprar, mas de que enjoarei rápido, como quando eu era criança. Tenho de dar um bom peteleco no "bichinho do consumo" que fica ali me mordendo os calcanhares, prendendo os tornozelos, e coçando, quando vejo aquelas canetas, cadernos, livros de arte e moda, histórias em quadrinhos, lançamentos e coletâneas, os últimos gritos da tecnologia.


Megastores, decididamente, viraram locais proibidos. Se fosse criança seria igual àquela que fica puxando a roupa da mãe no supermercado, pedindo isto e aquilo.

Meninas e bonecas. Homens e carrinhos e bolas (de futebol) . O fetiche das mulheres por roupas, sapatos e bolsas é mais inocente do que o dos homens; alguns que gostam muito de vê-las com certos sapatos e adereços. Vêm de quando tinham que usar as coisas de que gostavam nas bonecas, nossas projeções dos desejos. Agora são elas próprias, ou melhor, somos nós, nossas próprias Barbies. A casa de Barbie, as férias de Barbie, agora tudo é feito realidade. Isto é, se você admitir.

Os homens e a autoafirmação que conseguem dentro de carros e na sua loucura por times e torcidas, naquela hora do gol ou do xingamento ao juiz, não têm idade. A ponto de muitos quererem vestir seus filhotinhos verdadeiros, ainda na maternidade, com a camisa e a bandeira de seus times. Homens gostam de brinquedos. Dê um carrinho de miniatura, ou a miniatura de seus ídolos, e você vai ver um brilho de luz diferente nos olhos deles, por mais emburrados que sejam. Podem até disfarçar.

Os brinquedinhos prediletos de cada um de nós, descobertos, podem dizer mais a nosso respeito do que livros de biografia, e até dispensar remédios e as idas aos psiquiatras, psicólogos e psicanalistas. Há alguns anos eram famosos os radioamadores, entre outros hobbies que, mais do que atividades esportivas, trazem em si o lúdico. Bicicleta, kart, skate, surf, windsurf, asa delta.

Mas há também quem tenha como brinquedinho predileto a manipulação de gente de verdade, como se fossem os bonecos ventríloquos, os fantoches, saltimbancos. São os chefes terríveis, os políticos empoados fazendo discursos sobre promessas de vida, de futuro e de sonhos para quem ouvir ficar ali, amarrado e inerte. Temo que, quando crianças, eles fossem os que torturavam os bichinhos, estilingavam os passarinhos.

Há ainda quem tenha como brinquedinho preferido a manipulação pura e simples dos sentimentos dos outros, mantendo-as atreladas a si, no mesmo bambolê, por toda a vida, pulando corda, brincando de esconde-esconde, de forma quase sádica.

E os que fazem de suas próprias vidas roletas-russas, brinquedos - entre eles, os que gostam de esportes radicais onde sempre alguma coisa pode dar errado. Ou os irresponsáveis que saem por aí aprontando e que podem acabar levando junto uns anjos que não tinham nada a ver, para o céu, junto com eles, em seus rachas, bebedeiras, brigas. Em tempos atuais e virtuais, vale lembrar que certas atividades podem hoje ser menos perigosas quando apenas ensaiadas nos computadores, ou nos jogos eletr�?nicos.

Temos, enfim, de aprender melhor a brincar sozinhos. E a respeitar os brinquedinhos dos outros e o tempo de que cada um precisa para ser ou ficar feliz.

E você? Qual é o seu brinquedinho predileto? Como na propaganda, o que te dá uma felicidade que não tem preço?

São Paulo, balas e doces, Cosme e Damião, 2010.

(*) Marli Gonçalves é jornalista. Nestas datas, como o Dia da Criança, sinto certa tristeza e saudades das Lojas Modernas e de minha mãe que todos os anos me dava um brinquedinho, nem que fosse daqueles que vinham dentro do saco do arroz Brejeiro.


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