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segunda-feira, 27 de setembro de 2010

DEUS PERDOA!

Glória Patri et Fílio et Spirítui Sancto.
Amém.
Podemos começar, filho. Abra sua alma... Conte tudo...
Tudo o que?
Tudo o que estiver pesando sobre sua alma! Para que Deus o perdoe.
São só uns pecadilhos... Leves... O senhor sabe... Eu sou político...
Seja mais específico... Dê os detalhes que eu julgo se os pecados são veniais ou mortais... Conte-me seus desvios e eu avalio a gravidade.
Desvios? Como o senhor sabe, padre? Quem contou? O senhor tem parte com o Diabo?
Isso não vem ao caso. Desviou o que?
A verba da merenda escolar. É grave?
Muito grave.
Cinco pontos na carteira, padre?
Cinco rosários inteiros e mais dez pais-nossos.
Ufa! Podia ser pior.
Pior?
Os Juízes têm condenado ao pagamento de cestas básicas. E é uma dificuldade pegar mais merenda para encher as cestas. A imprensa fica de olho.
Deus é parcimonioso.
Padre, essa história de que o que a gente faz na Terra, paga no Céu é verdade?
Não tenho certeza... O bispo diz que é verdade, mas tem que ter um arrependimento sincero.
Só isso. Só se arrepender?
Sim.
Então... posso contar mais, padre?
Claro, meu filho. Alivie seu espírito. Limpe sua alma.
Pois é, padre. Limpei o almoxarifado do Posto de Saúde.
Porque fez isso, filho?
Culpa de meu bom coração. Ajudar meu cunhado. Ele tem uma farmácia e estava passando dificuldades. Quase sem estoque. Mas foram só uns remedinhos para pressão, insulina, comprimidos para dor de cabeça. Isso não é muito grave, é?
É gravíssimo.
Sete pontos?
É caso de suspensão da habilitação. Pessoas poderiam ter morrido.
Ah! Padre. Estariam chegando antes ao reino dos céus. Encontrado a paz eterna. Não teriam mais que enfrentar filas para pegar remédio.
De certa forma tem razão, filho.
Estou perdoado?
Cem Ave-Marias, trinta Pai Nossos e distribuição de brinquedos aos órfãos da pastoral.
Essa é difícil! Onde vou conseguir os brinquedos? O governo não manda para os municípios. Não tem pena alternativa? Podem ser livros didáticos?
Vejamos! O senhor vai subir de joelhos a escadaria da Matriz.
Oh! padre... A oposição vai me ridicularizar.
Ora! Fale para o povo que está pagando uma promessa.
Genial! O senhor não quer ser meu marqueteiro nas próximas eleições? O senhor capricha na Homilia e eu proponho uma taxinha extra no IPTU em prol das obras da Igreja.
Melhor não! Não dá muito certo misturar religião com política.
O senhor é que pensa... Posso confessar só mais uma coisinha?
Claro!
Pequei com a dona Santinha.
A beata? A filha do Serafim, o finado sacristão?
Ela mesma.
Meu deus! Isso foi um erro imperdoável.
Seu padre, a carne é fraca. Não posso ser perdoado?
O pecado deus perdoa, mas acho que você está frito.
Porque, padre?
Promete que não conta que quebrei o sigilo? Posso perder o cargo.
Claro, padre!
Ontem ela veio confessar que pecou com o senhor... Está grávida... Vai exigir uma pensão lascada para o bebê.
Filha de uma...
Palavrão, não pode! Mais dez pais-nossos.

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