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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

De listas, dietas, medidas e limites. Por Marli Gon çalves

Já que os critérios estão de cabeça para baixo, e somos tão diferentes entre nós, melhor propor pontuações. Cada um faz a sua tabela particular, as suas listas de avaliação e comparação, justas às suas próprias medidas e limites. Talvez essas tabelas já tenham até entrado em vigor e a gente não sabe. Só isso poderia explicar essas coisas absurdas que estamos vendo. Claro, absurdas, quando vistas de acordo com a minha LPMML (Lista Padrão Marli de Medidas e Limites)


Não sou de dar conselhos. Ou por achar que não adianta, ou mesmo por acreditar que eles possam não ser bem entendidos e poderiam gerar confusão. Mas outro dia, numa entusiasmada conversa com uma amiga, lasquei um, por preocupação. Espontâneo. Do bem. Ainda bem que ela sabe disso. Porque depois fiquei pensando que, na verdade, eu não estava levando em consideração o padrão dela, a lista dela. E sou defensora das liberdades individuais.

Antes que o telefone não pare de tocar, mas sem citar nomes, adianto que o conselho era para que ela não misturasse amor com política. Porque já vi não dar certo, inclusive no caso desta amiga. Mas depois fiquei cismando: na verdade, ela nunca vai se interessar por alguém que não goste de política, já que esse fator na tabela dela deve valer uns 200 pontos ou mais - numa escala de 1000. O bom é que ela também pontua beleza, "gostosice", juventude e gostar de transar nas suas decisões, o que resulta melhor.

Como geminiana, nesta vida, inúmeras vezes já reajustei a minha tabela. Houve tempo que minha atração recaía sobre quem soubesse tocar um instrumento, ou pintar um quadro bom; poderia valer centenas de pontos na minha LPMML. Se compusesse, cantasse e tocasse, então! - clímax. Se fosse um criador, valia. Em outros tempos, era a liderança o que me atraía. Mas já tive momentos que valia mais os rock n`roll, com proximidade de anarquismo, sonhadores. Em outros, quem escrevia ganhava qualquer parada, e não necessariamente eram jornalistas - tinham uma amargura, um ar ficcional, hábitos diferentes. Depois, trocados por quem gostasse muito de imagens, histórias em quadrinhos, fotografia, cinema.

Nas épocas de revolta, estrangeiros pareciam ser melhores; na ditadura, quem contra ela lutava. Cabelos limpos, cheirosos, elegância despojada, continuam valendo bem. E sempre havia e há os banidos, que não valem nada na lista: policiais de qualquer sorte, embora os rodoviários e bombeiros pudessem ser exceção para determinada atividade. Militares, não. Nada uniformizado, treinado, automático, igual. Imaginam em quantas roubadas não entrei, com esses meus critérios?

Zelar pelo nome, fazer algo pelo coletivo, humor, inteligência, senso de responsabilidade e de liberdade, companheirismo, carinho e dedicação, sem ciúmes. Esses ainda são atualmente os itens mais valiosos na minha tabela LPMML, menos nocivos, e encontráveis em pessoas mais comuns.

Assim, venho a público propor a realização de uma tabela média padrão, uma TMP, a exemplo daquela, altamente rentável, daquele médico, de dietas de pontos. Nesta poderíamos também subtrair. Assim, todo mundo valeria, vamos supor 1000 pontos para começar. Se alguma vez tiver sido violento, ameaçador, espancador, perderia de cara 2000 pontos, viraria nada. Dessa forma nos veríamos livres de ter Netinhos tentando ser senador de São Paulo. E nos veríamos livres também desses encostos tipo Dados Dolabella, o Zinho metido a galã que parece que está por aí enganando outra otária, até ser preso ou se meter numa encrenca daquelas de final triste.

Claro que vamos ter problemas para muitos plebiscitos até conseguir montar o padrão. Há quem goste de honestidade; há quem procure o contrário. Por isso pensei na tal dieta de pontos. Quer comer? Come. As calorias serão suas. Quer votar nesses trastes? Vota. Mas depois não venha reclamar, ou dizer que não sabia.

Há um formato mais simples para esse cálculo racional-emocional matemático. Mais usável no dia a dia. Pegue uma folha de papel. Risque ao meio. Do lado esquerdo, as avaliações negativas; do direito, as positivas, que precisam ser pelo menos um pouquinho maiores do que a outra. Dá para fazer isso com um monte de coisas dessa vida, não necessariamente tratando-se de amor, esse sentimento maluco que ataca quando menos se espera, sem dar tempo é de consultar nada. Não dá tempo nem de pensar, muito menos raciocinar.

Bem, devem existir outras formas. Mas agora ficarei (e você também) umas horas pensando quantos pontos valem um monte de detalhes: gostar de cachorro, gostar de gato, gostar de papagaio, gostar de crianças, gostar de ler, de falar a verdade, de te por para cima, de lavar louça, de estar ao seu lado...

São Paulo, menos 100 da poluição, menos 100 da violência, outros 100 pela sujeira... Neste mundo onde tudo é relativo.


(*) Marli Gonçalves é jornalista. Outro dia encontrou uma amiga, ansiosa. "Só você vai me dizer a verdade", falava. Surpresa, quando ela chega perto do meu rosto, arregala o olho e pergunta: "O que tem aqui no meu olho que hoje todo mundo está olhando dentro dele?". Não havia nada. Ela é que naquele dia tinha encontrado um número maior de pessoas que olham nos olhos, de forma límpida. Já reparou como estão ficando raras?

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